O Relevo, 2018

Exposição O Relevo traduz obras expostas em edições anteriores da Bienal do Mercosul e proporciona experiência sensorial tecnológica

A exposição O Relevo, ocorrida de 15 de março a 02 de junho no Centro Cultural CEEE Érico Veríssimo, mostrou traduções em relevo de obras que estiveram presentes ao longo de 10 edições da Bienal do Mercosul.

Desenvolvidas a partir da técnica inédita de afresco sintético, criada pela própria artista, as obras foram interpretadas nas mesmas dimensões e cores das originais, para que pudessem ser compreendidas e experimentadas por deficientes visuais por meio do toque. Os visitantes com visão também aproveitaram as sensações através de um ambiente com baixa luminosidade, a fim de nivelar a percepção de todos os presentes.

A experiência tecnológica foi proporcionada por meio de uma luva, criada em uma parceria entre a artista e a empresa ThoughtWorks Creative Technology Consultants, desenvolvida com as plataformas LilyPad e Arduino, próprias para aplicação de placas e chips em tecidos e vestimentas. A prototipação wearable serve ao conceito de Tecnologia Assistiva, que promove auxílio na melhoria da qualidade de vida de pessoas com algum tipo de limitação, no caso, visual. Com ela, os visitantes conseguiram enxergar os trabalhos de Lenora com a ponta dos dedos.

Para a artista, a oportunidade de democratizar a arte é uma tarefa especial. “Desde 2015, quando tive a oportunidade de receber um grupo de deficientes visuais em uma exposição no Museu de Arte de Blumenau (MAB/SC), venho encorajando o público a tocar meus trabalhos, sejam videntes ou deficientes visuais. Desta vez, a experiência sensorial aconteceu para todos, só que as avessas: quem enxergava é que saiu da zona de conforto! Meu trabalho vem com essa vontade, de minimizar as fronteiras, de unir as diferenças para o crescimento pessoal do público em geral”, define.

Entre as 12 obras em destaque, 10 traduções e duas autorais fizeram parte da exposição “Negra” de Tarsila do Amaral (Brasil), “Composición V”, de Maria Freire (Uruguai), “B.iB portrait #8”, de Kimani Beckford (Jamaica), “Composição”, de Fernand Léger (França) e “Bomba”, de Renzo Assano e Laila Terra (Brasil). As peças autorais de Lenora retratam os continentes, e representaram o elo que conecta todas as obras da mostra criadas por artistas de diversas regiões do mundo.

Além da ThoughtWorks, a Fundação Bienal Mercosul apoiou a iniciativa.

Professor Gilberto Schwartsmann

DEDOS DE VER

Quando li que a talentosa artista plástica Lenora Rosenfield fizera uma mostra de artes visuais para deficientes visuais, com o apoio da Fundação Cultural de Blumenau e da Associação de Cegos do Vale do Itajaí, em Santa Catarina, achei a ideia fascinante.
Artes visuais para deficientes visuais! Nada poderia ser mais inclusivo. Emocionei-me ainda mais ao ler o depoimento de um deficiente visual, que visitara a exposição. Disse que jamais imaginara poder um dia “apreciar a beleza de uma obra de arte com a ponta de seus dedos”.
Foi a partir desta experiência ímpar de Lenora que decidimos desafiá-la a selecionar algumas obras representativas da história das Bienais do Mercosul e produzir esta mostra dirigida especialmente aà deficientes visuais, e intitulada “O relevo”.
Mas a artista foi além. Com o auxílio de um grupo de pesquisadores, produziu um instrumento que, através do uso da sensibilidade vibratória dos dedos, possibilita ao deficiente visual agregar informações sobre cor à leitura tátil.
É claro que o tema suscita discussões. Há quem diga, por exemplo, que a experiência estética causada por uma obra de arte é única e qualquer tentativa dea traduzi-la para outra linguagem a descaracterizaria.
A verdade é que Lenora nos brinda com uma mostra que pode ser desfrutada por quem viveu sempre àa margem das artes visuais e agora “enxergará” obras de arte através da sensibilidade de seus dedos.
Mais do que isto, permitirá que pessoas, como a maioria de nós, que veem, possam desfrutar da mostra de arte com os olhos e, ao mesmo tempo, realizar a velha fantasia de poder deslizar os dedos sobre as telas, para sentir a sua textura.
Se para alguns, “traduzir” uma obra de arte é descaracterizá-la, seguindo o mesmo conceito, as “traduções” da artista, ao fim e ao cabo, brindam-nos com um precioso acervo de obras originais. “O relevo” é uma mostra de arte para ver e tocar.

 

Lenora Rosenfield

O RELEVO

A exposição O Relevo tem o objetivo de proporcionar aos portadores de deficiência visual a acessibilidade nas artes, através do tato, e permitir aos videntes (pessoas que enxergam) vivenciar a experiência como os portadores de deficiência visual.
A exposição é composta pela tradução de 10 dez obras de artistas que já participaram de edições anteriores da Bienal do Mercosul, acompanhadas por uma obra minha, num diálogo entre os vários mundos continentais e visuais que são banhados pelo Oceano Atlântico.
Nove delas estão dispostas entre os dois mapas de minha autoria, e uma, no primeiro nível do salão expositivo, A Negra, de Tarsila do Amaral.
As obras apresentadas não são apropriações e nem releituras, mas traduções confeccionadas com material diverso daquele utilizado pelo artista original -, realizadas na técnica do afresco sintético, resultado de uma pesquisa que desenvolvi há muitos anos, e que possibilita aos portadores de deficiência visual, a percepção de uma obra de arte.
Além da possibilidade tátil, o público poderá explorar a obra com a aplicação de tecnologia, vestindo luvas com sensores de sons e vibrações, capazes de interpretar a cor na superfície das obras, uma parceria valiosa com a empresa ThoughtWorks Creative Technology Consultants.
Os mapas que criei para essa exposição são os continentes, representados de forma mais aproximada, e o elo que os une são as obras de artistas de diferentes países. Essa conexão ocorreu primeiro em razão da proximidade física, período da Pangeia, quando todas as placas tectônicas estavam coladas, bem como os fenômenos naturais que foram transformando o planeta Terra em vários continentes e pelas influências que se estabeleceram ao longo de milênios de imigrações.
Os continentes são apresentados nas cores complementares verde-vermelho e amarelo-roxo, consideradas cores opostas no círculo cromático, mas quando colocadas lado a lado, uma potencializa a cor da outra, ratificando o objetivo dessa exposição, quando os portadores de deficiência visual, junto aos videntes, se potencializam e não se contrastam no espaço expositivo. Potência que deve reger, cada vez mais, as relações humanas.