Entre Mundos, 2019

Exposição realizada no Museu de Arte Leopoldo Gotuzzo – MALG, em Pelotas, com a curadoria de Lauer dos Santos, de 19 de setembro a 20 de outubro de 2019. O recorte mostra a produção da artista construída através de seus itinerários entre os mundos que visitou interna e geograficamente, revelados por meio das pinceladas marcadas e do uso livre dos materiais usados na pintura e sua expressão.

O Malg apresenta a exposição da artista pesquisadora, professora e restauradora Lenora Rosenfield. Sua obra se constrói através das marcas de seus itinerários. A materialidade pujante, a pincelada marcada e expressiva, as recorrentes referências ao corpo e a figura humana e a alusão à história da pintura revelam como suas escolhas, sua formação e seus destinos reverberam em sua produção e se atualizam em seu contexto. Nascida em Porto Alegre, estudou pintura na New School for Social Research (New York/ EUA), formou-se em desenho na Feevale (Novo Hamburgo/RS), estudou restauração no Istituto per l’Arte e il Restauro e no Gabinetto G. p. Vieusseux (Florença / Italia), fez mestrado em Artes Visuais na UFRGS (Porto Alegre/RS), doutorado na USP (São Paulo/SP), com estudos complementares na New York University, e pós-doutorado na Università degli Studi di Udine (Italia). Atuou como restauradora e também professora de pintura na UFRGS até 2017.
Nesta mostra o trânsito pelas técnicas e materiais – acrílica sobre tela, acrílica sobre papel, guache sobre papel, afresco sintético sobre não tecido – que é umas de suas características determinantes, concretiza alguns temas recorrentes: os retratos, o autorretrato e o corpo como medida e movimento que se desdobra em mapas. Toda a narrativa da artista parece apontar para a convergência de tempos e espaços costurados através de seus percursos e pelos distintos destinos adotados ao longo de sua carreira e formação.

Em meio a essa fluidez e transitoriedade, um dos aspectos constantes da obra de Lenora Rosenfield é a pincelada marcada que evidencia a conexão com a tradição da pintura do Rio Grande do Sul, seu lugar de origem, seguindo as direções traçadas por Iberê Camargo através do traço expressionista que alude à emoção e ao inconsciente, tão presentes em muitos artistas que despontaram na década de 1980 – período em que a produção da artista alcançou direções mais definidas.
Há variações, evidentemente. Algumas decorrentes da natureza mesma dos materiais e técnicas utilizados, outras oriundas de suas próprias escolhas em diferentes momentos, como o uso mais abusivo ou econômico da cor, por exemplo. “Autorretrato lll” é uma das obras presentes nesta exposição em que, através de uma representação gestual e colorida, a artista se apresenta em seu ofício construído, através da pincelada espontânea, um autorretrato en abyme que parece confirmar seu interesse pela tradição e pelo ofício da pintura.

O corpo como medida e como movimento é apresentado em “Dorso” e Minha própria carne” obras em que a presença da técnica e do material – afresco sintético sobre não tecido – se impõe ao uso da cor e da pincelada, que se tornam sensivelmente mais discretos nestes trabalhos. Já na série de gouaches sem título, as pinceladas pretas e aguadas retomam seu vigor em figuras imersas e reflexivas.
Nas series mais recentes de trabalhos é possível identificar uma espécie de síntese e fusão de várias características presentes em movimentos anteriores. As series “movimento”, “queda” e “sobrevoando” partem de representações corpo e do movimento da dança no espaço em direção a uma simplificação e abstração da forma que evoca mapas e arquipélagos vistos no alto. O interesse da artista pela quadricula e pela grade, associado a configuração de pinturas modulares em pequenos formatos, configura conjuntos que se integram ao espaço arquitetônico sem perder de vista a unicidade de cada obra modular em conjuntos de imagens que, por sua vez, reverberam os tantos mundos que Lenora Rosenfield compartilha conosco através de sua obra poética.